segunda-feira, abril 13, 2009

Jogar Ténis ou Trabalhar Ténis

O ténis Nacional vive neste momento um momento muito bom devido ao sucesso de alguns projectos individuais de características muito especiais que estão a dar cada vez mais notoriedade ao ténis Nacional além fronteiras. As marcas desportivas e os agentes estão com os olhos cada vez mais atentos ao que começa a sair do nosso país devido a visibilidade desses mesmos exemplos. Mas será que isto é reflexo da realidade do nosso ténis? Quantos atletas temos nós na "traseiras" dos que estão neste momento a dar nas vistas?

O ténis é uma modalidade mundializada e que envolve muito capital a nível mundial. É um dos únicos desportos que abre portas tanto na vertente masculina como na feminina, sendo que é o único desporto que tem um homem e uma mulher na lista dos 10 atletas mais bem pagos do mundo em todos os desportos - Federer com cerca de 23 milhões e Sharapova com 18 milhões de dolares apenas no ano de 2008. Sendo que Sharapova é a atleta mais bem paga do mundo em qualquer deporto e a única desportista dentro desta lista...sendo que o pódio feminino é todo do ténis.No mundo todo, e principalmente em países e em famílias com mentalidade mundializada, há quem esteja disposto ao que seja necessário para atingir estes objectivos. Um atleta de top 150 em masculinos e de top 80 em femininos ganha já muito acima de quase qualquer profissão na maior parte do mundo, e tem a oportunidade de ter experiências fantásticas em todo o mundo viajando e participando nos melhores torneios com as melhores condições possíveis. Com a mediatização que consegue no seu país e no mundo, abre-lhe um conjunto de opções a nível mundial quando termina a carreira. Um atleta juvenil que atinja o top 50 mundial de juniores tem regalias muito semelhantes a um atleta de top senior, sendo que apenas não recebe prize-money. No entanto, há já contractos de verbas elevadas com marcas desportivas como a Nike, a Adidas, a Wilson, a Prince, e todas aquelas que têm impacto mundial e que podem vir a retirar lucros altos de uma "explosão" de um atleta no circuito profissional. Tem estadia nos principais torneios do mundo de juniores, e se for um dos melhores mundiais (em que vejam talento para ir mais longe), recebe já patrocínios que lhe custeam as viagens todas num projecto individual, bem como os custos do treinador particular de alto nível que geralmente é bastante caro e é a principal despesa nestas idades (e em quase qualquer idade).

Os bons atletas juvenis que não conseguem ou não querem apostar profissionalmente (ou que não têm condições), podem ganhar bolas de estudo para algumas das melhores universidades nos EUA com os cursos todos pagos, jogando em simultâneo a um nível bastante elevado e podendo seguir carreira após 2 ou 4 anos de curso superior. Foi o caso da Davenport, do James Blake, do Todd Martin, só para citar alguns dos mais conhecidos. Estas bolas equivalem a um investimento na ordem dos 200.000 dolares que é o custo médio de um curso nestas univerisades.O retorno do ténis tanto a nível financeiro como a nível pessoal é enorme, sendo que as experiências que se obtém com ele a este nível são como os anglófonos costuma dizer...priceless!! Qual o impacto num jovem, quando correctamente orientado, de estar a viajar pelo mundo em busca de um sonho, conhecendo as diversas culturas, estabelecendo contactos no mundo inteiro, aperfeiçoando as diversas línguas e vendo e experimentando tudo o que os outros apenas vêm nos livros? Isto são experiências que não têm preço, e que se correctamente orientadas irão reflectir-se positivamente em toda a sua vida, mesmo que venha a seguir outro rumo que não o do ténis profissional.Há países do mundo que já interiorizaram imenso esta perspectiva, e principalmente países que passaram por dificulades muito graves ao longo da sua história mais recente, ou países que devido ao seu percurso histórico têm uma mentalidade de excelência mundial que vem de nascença e passa de pais para filhos de uma forma cultural. A mentalidade que diz que se eu tiver um talento numa actividade que goste, é quase minha obrigação levar esse mesmo talento ao máximo das minhas capacidades. No tour que se realiza no final do ano nos EUA, dá para sentir isto porque apanha os diversos escalões. Neste ano houveram 1300 a 1500 atletas dos vários escalões, e de todos os pontos do mundo, que estavam lá num dos maiores palcos em busca destes objectivos. Não havia um continente que não tivesse os seus melhores atletas lá representados. Atletas em selecções, com treinadores particulares, com pais e treinadores, com pais que eram os treinadores, de academias pelo mundo fora etc. A maioria deles conscientes do que exponho acima, e sabendo que é necessário esforço para vir a conseguir objectivos elevados e rentablizar ao máximo o tempo que passam neste momento dedicados a uma tarefa.

Há vários atletas que se mudam para os locais onde conseguem encontrar um bom treinador que esteja disposto a apostar nele, há familias inteiras que vão à procura de melhores condições de treino, há outros que fazem empréstimos para poderem contratar os melhores treinadores e equipas de treino para que os filhos possam tentar com o máximo de condições, etc, etc, etc. Todos conhecemos a história do Marat Safin, que aos 11/12 anos chegou a Valência SOZINHO com as malas porque queria treinar para ser profissional, ou dos pais da Maria Sharapova que chegaram aos EUA praticamente sem nada mas que se mudaram para que a filha pudesse treinar em condições, e muitos outros casos do género que quem anda no circuito juvenil sabe que se passam. A nossa própria Michelle, que a família se mudou toda para a Florida para lhe dar condições de explorar todo o seu potencial. Será que em Portugal temos essa mentalidade? Pergunto-me quantas são as famílias que vão à procura das melhores condições de treino onde quer que elas estejam? Quantos são so atletas de 12 anos que estariam dispostos a estudar pela internet para treinar de manhã e de tarde num grupo da idade deles tendo em vista a procura de um objectivo a longo prazo, e quantos seriam os pais que estariam dispostos a aceitar uma situação destas para os seus filhos? Quantos seriam os miúdos de 12/13/14 que estão dispostos a deixar de ver o ténis apenas como uma brincadeira, e estarem dispostos a trabalhar ténis? Preocuparem-se com a sua alimentação? Fazerem preparação física todos os dias adequada à idade? Treinar 4 ou 5 horas por dia 5 a 6 vezes por semana? Fazer treinos particulares para trabalho de aspectos específicos de jogo com várias repetições em busca da "perfeição" que sabemos que nunca atingímos? Abdicar de grande parte da vida social fora do ténis de modo a procurar um objectivo? Passar um mínimo de 20 semanas fora de Portugal em torneios internacionais, mais estágios etc? E quantos treinadores estariam dispostos a fazer este tipo de apostas, que exigem estudo e actualização constante do que de melhor se faz no mundo e um nível de entrega elevado com a responsabilidade de viajar com filhos de outros para fora do país? E quantos treinadores temos em Portugal capazes de o fazer com qualidade? Em Portugal, nos poucos projectos privados que existem com estes objectivos, os atletas ficam geralmente muito isolados porque contam-se pelos dedos das mãos aqueles que estão a tentar seguir um percurso profissionalizante nesta modalidade. Como se isto não fosse duro o suficiente, a mentalidade negativa e invejosa que caracteriza o nosso país em diversas situações faz com que uma das motivações do jovem para a modalidade - o reconhecimento - seja muito complicado de gerir, visto que ele é praticamente inexistente no pais em que vivemos. Em vez de valorizarmos aqueles que estão a tentar fazer algo de diferente com todos os aspectos acima mencioandos, temos tendência em ir buscar as coisas que a nosso entender estão mal no projecto em causa, e de soltar cá para fora todas as nossas invejas. Isto pode rebentar a motivação de muitos jovens atletas que ao estarem a fazer um esforço pessoal elevado, com cargas emocionais elevadas que existem num projecto de alta-competição, sentindo o esforço financeiro que os pais fazem e não tendo muitos colegas ao lado a fazer o mesmo (antes pelo contrário), podem-se questionar..."para quê??" Para quê que eu me vou tar a esforçar num país que só sabe é falar mal e não reconhecer as coisas que são bem feitas quando até posso ter uma vida sem chatices e com bastante divertimento?Num país em que o sistema escolar tb não ajuda e que há muito poucos com actividades extra-curriculares (ao contrário de muitos outros países em que é quase obrigatório), e quem estuda pela internet ou por correspondência é um "extraterrestre", um dos principais factores em idades juvenis que é a integração, não está presente, visto que em vez de valorizado, o atleta é olhado como um ser estranho...

A cultura de trabalho e de esforço para objectivos a longo prazo não é um dos fortes do nosso país, e esse é um dos aspectos que temos de mudar se queremos evoluir no ténis internacional. O Acreditar, tal como já referi numa das minhas primeiras crónicas, é um dos factores fundamentais, assim como a motivação. A meu ver vêm as duas de mãos dadas. No ténis feminino estes factores são ainda mais relevantes visto que as motivações para a competição individual são ainda mais externas do que no ténis masculino. Se estas não estiverem presentes torna-se ainda mais complicado... Para além disso, penso que no nosso país joga-se cada vez mais ténis, mas ainda se trabalha muito pouco ténis. E isto está decorrente dos factores que expus acima e da falta de consciência sobre o nível de competição internacional que existe. Não é incomum encontrar comportamentos que espelham a falta de noção do que é necessário trabalhar ténis para atingir determinados patamares internacionais. Ainda há alguns anos enquanto seleccionador das camadas jovens e viajando com vários atletas juvenis de topo em Portugal na altura, num determinado torneio apanhei vários atletas a apanhar bebedeiras em conjunto entre dois torneios internacionais de sub 16, ou atletas de sub 14 e sub 16 que é preciso estar a mandá-los para a cama quando têm jogos importantes no dia seguinte, ou o simples facto de toda a gente andar a comer gelados e batatas fritas nos diversos torneios com refrigerantes gaseificados, ou a falta de preocupação com outros muitos aspectos que são vitais para quem tenciona ser jogador, ou pelo menos tentar em condições. Lembro-me de estar no campeonato da europa de sub 16 na Bélgica em 2004, e de estar com o seleccionador de sub 16 femininos de Espanha que acompanhava na altura a Carla Suarez Navarro. Viajámos por mais alguns torneios e europeus juntos tais como a Winter Cup, e alguns ITF's juniores, e comentei com ele que nunca as vi fora do quarto depois das 22h. A eles e a quase todas as que estavam neste tipo de enquadramento. Descontraídas e divertidas mas sempre bem dispostas a fazer tudo o que tinham de fazer sem reclamar relativamente à alimentação, dormidas, treinos, físico, etc... e a Carla treinava na altura individualmente fora de qualquer centro de treino com um treinador particular. Quando estamos inseridos numa realidade em que praticamente ninguém faz determinados tipos de "sacrifícios" em nome de um objectivo a longo prazo, é muito difícil um atleta na adolescência fazê-lo expontaneamente e naturalmente sem que esteja sempre a questão na sua cabeça de "mas só só eu que faço isto?" Daí a importância do atleta ser exposto em idades precoces a ambientes que lhe façam ver que se quiser ser realmente jogador terá de fazer aquilo que os outros todos lá fora também fazem...e perceber que a competição é dura e que exige esforço em todos os patamares de treino...mas que tem diversas recompensas a diversos níveis (profissional, universidade, experiências pessoais). Jogar ténis competitivo e participar em algumas competições como intrumento de formação de personalidade e desenvolvimento saudável é extremamente benéfico a todos os níveis, mas se queremos ter atletas de alto rendimento, o percurso é diferente, e para não dependermos quase do "acaso", é preciso criar uma cultura de "trabalhar ténis" no seio dos nossos melhores jogadores nos diversos escalões e é preciso valorizar aqueles que estejam dispostos a isso, sabendo que estão a investir pessoalmente e financeiramente nessas carreiras e que a gratificação externa é muito importante nestas fases. A meu entender este é um factor vital, e um dos determinantes no sucesso ou insucesso futuro do nosso ténis.

César Coutinho

O nosso Ténis vive uma vida nova. Estamos preparados para aproveitar?

Os resultados internacionais de alguns dos nossos melhores atletas veio dar mais ênfase a um sentimento que me tem acompanhado nos últimos tempos: podemos estar a passar por um momento de viragem no nosso ténis. Por pura coincidência, no dia que escrevo esta crónica, o Frederico Gil faz mais um resultado histórico para o nosso ténis ao atingir a ½ final do ATP de Joanesburgo.

Penso que Portugal nunca esteve numa posição tão promissora. Para além daqueles que já se afirmaram e dos quais ainda esperamos melhores feitos, como Frederico Gil, Leonardo Tavares ou Rui Machado, temos duas das grandes promessas do ténis mundial: Gastão e Michell. Para além destes, ainda contamos com talentos como João Sousa, Pedro Sousa, Francisco Dias, Miguel Almeida ou Martin Trueva. Se falarmos dos mais novos, poderemos citar o nome de muitos jovens talentosos que bem conheço e com quem tenho tido o privilégio de trabalhar nas selecções nacionais ao longo dos últimos anos, como Barbara Luz., Francisco Ramos, Patrícia Martins, Joana Vale Costa, Maria João Koeller, Vasco Mensurado, Frederico Silva ou Gonçalo Loureiro, para citar apenas alguns. Todos eles já deram provas do seu valor a nível internacional.
Podemos assistir, nos próximos tempos, a um "boom" da modalidade em Portugal caso algum (ou alguns) destes talentos se confirmem como grandes campeões da modalidade. O nascimento de um "estrela" trás inúmeras vantagens para a modalidade decorrentes, logicamente, do enorme mediatismo a que fica sujeita. Esse mediatismo tem como consequência mais investimento por parte das empresas e mais alunos nas nossas escolas de ténis. Para além destas vantagens, existe uma que não é tão visível, mas que é essencial para a criação de novos valores para o futuro: passamos a ter um referencial de sucesso, essencial para a auto-confiança dos nossos atletas, pais e treinadores.

Antes de mais é preciso acreditar. E não é fácil acreditar em Portugal! Temos de lutar contra um historial sem muito sucesso e, mais difícil ainda, contra uma forma de estar de muitos dos que envolvem a modalidade, negativista e pouco estimulante para aqueles que diariamente treinam e competem para chegar o mais longe possível. Valorizamos pouco os nossos feitos e temos tendência para nos auto-flagelar com os resultados menos positivos. Muitas vezes elevamos demasiado as expectativas, criando pressão sobre os nossos jovens e deixamos de nos focar naquilo que é essencial: o seu desenvolvimento como jogadores. Pior ainda, é frequente assistirmos a jogadores que passaram ao lado de uma promissora carreira porque o seu processo de desenvolvimento foi hipotecado pela ânsia de resultados imediatos e pela pressão em alcançá-los. Infelizmente, tão depressa temos um "grande campeão" como, às primeiras dificuldades, dizemos que temos mais um "talento perdido". Não nos podemos esquecer que a carreira de qualquer jogador passa por momentos de sucesso e por períodos difíceis, muitas vezes acompanhados de derrotas sucessivas e resultados aquém do esperado. Só aqueles que conseguem ultrapassar estes momentos, podem triunfar. É preciso acreditar, definir o rumo a seguir e não vacilar perante as dificuldades.

Espero que os nossos jovens talentos "acreditem" e que em breve possamos comemorar a presença de jogadores portugueses entre os melhores do Mundo, e que todos os agentes da modalidade aproveitem essa oportunidade para desenvolver o ténis em Portugal. Quando falo em desenvolver, refiro-me concretamente ao desenvolvimento estrutural, sustentado em projectos que visem criar bases para a formação de novos valores nas gerações seguintes e que passa essencialmente por um projecto de formação de jogadores, pela certificação dos clubes, pela formação de técnicos e dirigentes, pela angariação de novos parceiros/sponsors para a modalidade e pela criação de condições de excelência para o alto-rendimento.

Pedro Felner

pfelner@hotmail.com
pfelner@esdrm.pt

sábado, novembro 22, 2008

Rendimento na Formação ou Formação para o Rendimento?

Factores no percurso do atleta de alto rendimento


Quando trabalhamos com atletas nos escalões de formação o nosso enfoque principal deverá ser na evolução do respectivo atleta, e não os resultados imediatos do mesmo. As duas coisas podem andar a par, mas nem sempre são compatíveis principalmente quando falamos de idades precoces. Vejo muitas vezes em todos os países em que estou, atletas, treinadores e pais mais preocupados em ganhar um jogo do que em fazer aquilo que lhes fará ganhar no futuro. Por vezes vejo treinadores e pais a incentivarem os padrões que farão com que esse atleta possa possivelmente ganhar esse mesmo jogo, mas que ao fazê-lo estarão a reforçar e incentivar um comportamento que de certeza que não lhe fará ganhar muitos jogos mais tarde, quando realmente começar a interessar.
O objectivo de todos os circuitos juvenis é o de preparar o melhor possível os jogadores para a entrada no circuito profissional, sendo que para quem quer ser jogador, esse é o circuito que conta na realidade (o profissional). Os resultados nos juvenis têm sempre de ser relativizados, visto que dependem sempre dos factores que levaram os atletas a conseguir os respectivos resultados. Há diversos factores influenciadores, que por vezes não estão directamente relacionados com os aspectos fundamentais do sucesso de um jogador a longo prazo. Pode haver por exemplo factores maturacionais demasiado presentes, o que altera a “verdade” do resultado, ou o número de anos de prática, que de início é bastante relevante, mas que se vai diluíndo com o passar do tempo. No entanto, sempre que isto se passa desta forma, mais tarde, quando todos começarem a chegar à idade adulta, tudo se começa a nivelar, e alguns dos factores perdem importância, havendo outros que assumem maior relevância.
Enquanto treinadores, quando olhamos para um atleta em idade de formação, devemos procurar identificar os factores que podem vir a ser determinantes na performance desse mesmo atleta no futuro, e não guiar-mo-nos apenas pelo resultado que consegue no torneio X ou Y, ou que consegue contra este ou aquele atleta.
Um atleta para conseguir fazer qualquer coisa a nível internacional, para além das diversas capacidades que tem de ter, tanto técnicas, como físicas, tácticas psicológicas, etc, tem de acreditar que é capaz de conseguir atingir objectivos elevados. De modo a que ele tenha essa perspectiva, obviamente que têm de existir resultados mínimos que o mantenham motivado (e a toda a equipa), mas acima de tudo, tem de sentir que se treinar muito e bem, e for exposto nos locais certos, terá potencial para pelo menos igualar com os melhores do mundo da idade. O/a atleta deve ser exposto regularmente a confrontos com os melhores da idade de modo a que cresçam todos juntos e acabem por se puxar uns aos outros. Isto deve ser feito desde as idades mais tenras desde que devidamente enquadrado no processo. E só quem está a gerir o processo é que sabe a razão dos enquadramentos. Apesar de importante em termos motivacionais, não é uma representação ou duas esporádicas numa selecção nacional que vão ser determinantes no “projecto” de um atleta. Há muitos outros factores muito mais relevantes que assumem importancia vital, tais como:
- o desenvolvimento motor adequado em idades precoces
- o desenvolvimento técnico adequado de modo a que o atleta esteja livre de lacunas e “limpo”
- Um projecto que enquadre torneios nacionais e internacionais adequados ao seu desenvolvimento e plano de objectivos definido pela equipa de trabalho
- Conceptualização e execução de um percurso que lhe permita ser mais atraente para patrocínios e atractivo para as empresas de management, que quando bem utilizadas são uma mais valia bastante grande
- Criação no atleta de uma mentalidade global e mundial, vital para o sucesso numa área como o ténis. Não é a pensar em ser o número 1 de Lisboa ou de Portugal que vai conseguir ser jogador. É preciso ter uma perspectiva global do que é necessário para atingir níveis elevados de performance e focar-se no processo e nos objectivos que o levarão a esses mesmos níveis. A sobrevalorização do resultado leva a frustrações elevadas nos atletas, e a uma perspectiva que nem sempre é condutiva ao desenvolvimento adequado. É o mesmo que estarmos a pensar que queremos ser ricos, sem sequer pensarmos o que temos de fazer (e criar um plano exequível) para o conseguir.

Nos contactos que temos tido com grandes marcas e empresas de management no ténis ao mais alto nível, apercebemo-nos que os resultados (mesmo a nível de top ITF junior) não são o mais relevante na cabeça e nas escolhas dos “olheiros” dessas mesmas marcas e empresas que andam sempre em busca do próximo “Federer” ou “Nadal”, ou “Sharapova”. Há outros factores que assumem vital relevância para os mesmos:
- limpeza técnica – um atleta tem de estar com um bom nível de eficácia em todos os batimentos principais, e ser capaz de gerar velocidade com um bom nível de precisão
- competitividade – que gostaria de definir pela capacidade de lutar e dar o máximo por todos os pontos independentemente do resultado. Jogadores demasiado focados no resultado têm geralmente dificuldade em se manterem positivos durante um jogo todo
- capacidade e velocidade de aprendizagem – fundamental para poder atingir níveis elevados de performance. Há muita coisa a aprender, e quanto mais depressa o fizer (com qualidade) mais depressa poderá competir ao mais alto nível, e mais valerá o atleta na “bolsa” de contractos publicitários, roupa, raquetes, etc...
- enquadramento técnico – por mais que um atleta apresente capacidades, é pouco provável que tenha os resultados pretendidos se não tiver um enquadramento adequado. Estas empresas querem conhecer qual o enquadramento do mesmo de modo a apresentar garantias de qualidade no desenvolvimento dos factores que são sempre necessários de desenvolver em qualquer idade e nível de jogo
- enquadramento familiar – ter a garantia que os pais têm a perspectiva certa relativamente ao projecto, e que caso sejam igualmente os treinadores (que se passa muito no circuito feminino internacional), apresentem o mínimo de garantias nos factores acima mencionados.
- Características físicas – atletas rápidos, explosivos e com boas características genéticas (que tb podem ser trabalhadas), com uma boa base de capacidades sobre a qual terá de assentar bastante trabalho
- Imagem e personalidade – importante para todas as marcas e agentes, visto que estamos a representar marcas que querem assentar a sua estratégia de marketing em figuras de destaque e carisma, tal como querem que sejam as suas empresas.

Ao elaborarmos um projecto para a alta-competição é necessário ter em conta todos estes factores e conseguir ter uma visão a longo prazo, sabendo quais as etapas que o atleta deve atingir em cada faixa etária, em todas as suas vertentes de desenvolvimento. Isto tem de ser pensado pela equipa de trabalho, havendo geralmente uma pessoa que está encarregue do mesmo. Grandes projectos têm geralmente um mentor, que funciona como uma espécie de gestor de recursos humanos de todo o projecto e que tem de ter uma visão alargada e mundializada sobre o fenómeno desportivo em geral e tenístico em particular.

O ténis é um desporto individual e os atletas têm de se focar em dar o seu melhor e planear o melhor possível o seu projecto. A aprendizagem individual do atleta num projecto destes quando bem orientada em termos pessoais, é sempre gratificante e estimuladora de inúmeras capacidades que irão servir o atleta/pessoa para o resto da sua vida. Essa é a PRINCIPAL RIQUEZA DO TÉNIS. Quando se quer fazer uma aposta mais séria tendo em vista o profissionalismo, funciona como um investimento em que os riscos financeiros têm de ser medidos e ponderados...

César Coutinho

segunda-feira, outubro 20, 2008

Reflexão sobre a formação de jogadores em Portugal


Sabemos que a esmagadora maioria dos treinadores trabalham na formação, com crianças e jovens. Sabemos também que a fase mais importante do desenvolvimento do jogador é a sua formação inicial, nomeadamente a nível técnico e táctico. É aqui que muito se decide - uma boa formação de base não garante o sucesso do jogador a médio-longo prazo, mas uma formação deficiente ou incompleta é garantia de insucesso.

Penso que o ténis nacional nunca esteve tão bem servido de técnicos. Existe actualmente em Portugal um sem número de treinadores competentes, motivados e conhecedores da modalidade. Para além disso, podemos constatar uma saudável convivência e partilha de conhecimentos e experiências entre treinadores com diferentes percursos profissionais, o que vem enriquecer ainda mais o nosso ténis. Nunca, como hoje, existiram tantos treinadores no activo com tão vasta experiência como jogadores profissionais, nem tantos treinadores com formação académica superior. Nunca, como hoje, existiram tantos treinadores a viajar e a “beber” o que de melhor se faz lá fora. Também nunca houve, como hoje, tanto interesse pela formação técnica e científica, como podemos constatar nos inúmeros cursos, acções de formação e simpósios realizados em Portugal.

No entanto, é urgente sistematizar este conhecimento e torná-lo acessível e operacional ao maior número possível de técnicos. Para isso, é necessário desenvolver projectos que permitam melhorar ainda mais a qualidade do trabalho que desenvolvemos com os nossos jovens atletas. O desenvolvimento de uma Escola Nacional de Formação de Jogadores, articulada de forma coerente com a formação de treinadores, permitiria que todos falassem a mesma linguagem, tendo por base uma referência comum.

Defendo a criação de um “programa nacional de formação de jogadores” que sirva como linha orientadora do trabalho que desenvolvemos nos clubes com os nossos atletas, e onde estariam contempladas orientações relativas ao trabalho técnico, táctico, físico e mental a desenvolver em cada idade/etapa de desenvolvimento, cargas de treino, orientações relativas à qualidade do treino, programação competitiva, entre outras.

Esse “modelo” deveria servir de referência para o trabalho desenvolvido pelos treinadores nos seus clubes e pela FPT ao nível do PNDT e das selecções nacionais juvenis. A sua elaboração deveria ser feita através de uma discussão alargada, constituída por um grupo de trabalho com os melhores técnicos nacionais e, porque não, com a colaboração de técnicos estrangeiros.

Temos de criar a nossa escola de formação de jogadores, tendo em conta as características normalmente associadas aos nossos atletas (emotivos, sem grande estatura, talentosos) e às especificidades da modalidade em Portugal (pisos diversificados, pouca competitividade interna, país periférico). Podemos constatar que os países mais desenvolvidos no ténis têm o seu modelo de formação e os seus técnicos dominam esse modelo e trabalham de acordo com o mesmo. Não é por acaso que os jogadores franceses (país com mais jogadores no top 100 ATP) são geralmente muito bons tecnicamente e completos em termos tácticos, constituindo o chamado “jogador completo”; os espanhóis são muito fortes física e mentalmente e dominam o jogo de fundo do campo; os croatas possuem um jogo agressivo baseado num excelente serviço e os australianos dominam o serviço e a rede. Estes países, apesar de terem um modelo de formação de jogadores bastante enraizado, têm a capacidade de o adaptar à individualidade de cada jogador. Por esta razão, temos jogadores como Lleiton Hewit que, com o seu estilo mais defensivo ou de contra-ataque, se afasta do padrão-tipo do jogador australiano ou Feliciano Lopez, com um estilo de jogo muito baseado no serviço e num jogo de rede eficiente, algo atípico no ténis espanhol.

O sucesso nos escalões de formação é um bom indicador e dá-nos esperança para o futuro. No entanto, estes resultados correspondem ao princípio de um longo caminho. Não devemos formar jogadores para ter sucesso nos escalões de formação. Se tiverem, melhor, mas a preocupação principal deverá sempre passar pelo desenvolvimento dos requisitos necessários para mais tarde, no circuito profissional, terem maior probabilidade de êxito. Poderíamos perguntar: e que requisitos são esses? A resposta a esta pergunta deveria estar contemplada no programa nacional de formação de jogadores e todos os treinadores deveriam dominar os conteúdos aí expressos.

Penso que a única forma de termos muitos jogadores com qualidade e, principalmente, de forma sustentada de geração em geração, passa por desenvolver um projecto de formação sólido, de base e de âmbito nacional. Esse trabalho passa claramente pelos clubes e pelos seus treinadores. Os clubes devem ser certificados em função da qualidade do trabalho realizado ao nível da formação e devem ser dados incentivos para proporcionar melhores condições a essas entidades. É da qualidade do trabalho realizado pelos treinadores nas centenas de escolas de ténis espalhadas pelo país que depende, em grande parte, o sucesso do nosso ténis. Só desta forma, o ténis português deixará de estar dependente de talentos pontuais ou de felizes coincidências.


Pedro Felner
pfelner@hotmail.com
pfelner@esdrm.pt

quinta-feira, setembro 04, 2008

Treinador ou Gestor?...O perfil do treinador do Futuro

"No simpósio europeu de treinadores de 2004, realizado em Malta, todos os principais prelectores referiram a importância de haver um programa de detecção de talentos de treinadores a par de um programa de detecção de talentos de jogadores. A estes, é necessário criar condições de desenvolvimento, possibilitando experiências internacionais e dando possibilidade de formação de modo a atingirem o seu máximo potencial (jogadores e treinadores)".

Durante alguns tours juvenis que fiz neste Verão, houve um livro que me acompanhou sempre, e sobre o qual reflecti um pouco. O livro em causa faz a análise das capacidades necessárias para ser treinador ou gestor de topo em qualquer área que envolva contacto e direcção de pessoas. O autor é um Gestor e consultor bastante conhecido em Inglaterra, e analisa as qualidades comuns aos diversos cargos que se caracterizam por gerir pessoas ao mais alto nível em situação de pressão...

mais no site http://www.bolamarela.com/, através do link
http://www.bolamarela.com/pt/cronicas.php?ref=8

César Coutinho

terça-feira, abril 29, 2008

Aspectos decisivos para o ensino de uma técnica eficiente


Neste artigo pretendo fazer referência a alguns aspectos técnicos que julgo essenciais, e aos quais nem sempre damos a atenção devida. Se falamos de técnica, devemos ter presente a sua definição mais geral: máxima eficiência, com o mínimo dispêndio de energia. Quando falamos em eficiência, estamos a pensar na capacidade de jogar com controlo, velocidade, consistência etc. No entanto, é decisivo que a execução do gesto técnico seja acompanhada de um dispêndio de energia mínimo, que permita ao jogador manter a eficiência durante períodos prolongados de tempo.

A correcta aprendizagem técnica não depende apenas do respeito pelos princípios biomecânicos. Factores físicos/fisiológicos e mentais influenciam de forma decisiva a sua aprendizagem e desenvolvimento. Neste artigo procuro abordar de forma simples alguns aspectos que julgo essenciais para um correcto ensino da técnica. Embora muitos dos conceitos abaixo mencionados estejam relacionados entre si, para melhor entendimento optei por organizá-los da seguinte forma:


Fluidez de movimentos

Para desenvolver uma técnica simples e económica devemos habituar os alunos a aproveitarem o “peso da raquete” para ganhar velocidade (fase de aceleração). Para isso, é também importante introduzir movimentos de preparação com alguma amplitude. No caso do gesto técnico de direita e esquerda defendo que, na fase final da preparação a raquete deve estar sensivelmente à altura do ombro, iniciando a partir deste momento o movimento descendente, aproveitando o peso da raquete para gerar velocidade.


Respiração

Uma correcta respiração facilita o relaxamento muscular necessário para uma correcta execução técnica e ajuda a controlar a fadiga física. Aconselho por isso a ensinar, desde cedo, as crianças a respirarem correctamente, expirando sempre no momento do impacto com a bola.


Tensão Muscular

A exagerada tensão muscular não ajuda a produzir velocidade e promove maiores gastos energéticos. È importante ensinar a não agarrar o punho da raquete com força excessiva e a manter o braço relaxado em todos os batimentos.


Movimentos Parasitas

Devemos evitar os movimentos supérfluos ou a utilização de segmentos corporais irrelevantes para a eficiência do gesto técnico. Estas situações originam perdas de energia na cadeia de coordenação originando golpes menos potentes e precisos e maior esforço físico para os executar. Na iniciação à modalidade, é importante ensinar a técnica de forma simples e ajustar o seu ensino às capacidades do aluno em cada momento.


Equilíbrio dinâmico

O equilíbrio tem um papel fundamental na correcta execução técnica. Devemos ter a preocupação de desenvolver esta capacidade através de exercícios gerais ou específicos. Existem alguns aspectos fundamentais relacionados com o equilíbrio que devem ser trabalhados de forma sistemática: a correcta colocação dos apoios, a correcta transferência do peso do corpo (tendo em atenção a predominância do tipo de movimento - linear ou angular) e a fixação da cabeça durante o batimento.


Confiança

O aluno não pode ter medo de bater a bola. Este é um pré-requisito fundamental para evitar a tensão muscular exagerada, permitir uma fluidez de movimentos adequada e, consequentemente, desenvolver a técnica correcta. É comum, numa fase inicial da aprendizagem, os alunos jogarem demasiado contraídos ou encurtarem o gesto, na expectativa de obterem maior controlo no batimento. A utilização de bolas sem pressão ou bolas progressivas (mesmo jogando ao fundo do campo) é recomendada. Este tipo de bolas permitem ao aluno “soltar o braço”, mantendo a bola controlada.



Pedro Felner
pfelner@hotmail.com
pfelner@esdrm.pt

quarta-feira, março 12, 2008

Sucesso no Ténis - A Ciência por trás dos resultados

Encontra-se à venda (através de encomenda) em Portugal e no Brasil, o livro intitulado “Sucesso no Ténis – a Ciência por trás dos resultados” que conta com o apoio e reconhecimento das seguintes instituições:

- Federação Internacional de Ténis (ITF)
- Federação Portuguesa de Ténis (FPT)
- Confederação Brasileira de Ténis (CBT)
- Faculdade de Motricidade Humana (FMH)

O livro conta com o apoio comercial da marca desportiva Wilson. É o primeiro livro deste género escrito em português sobre ténis, e que aborda temas tão distintos como: O desenvolvimento a longo a prazo do jogador; Caracterização fisiológica do ténis; A nutrição e hidratação; Principios Biomecânicos; Psicologia no Ténis; condicionantes físicas; Tenis de Alta competição (e percurso); a especificidade do ténis feminino e o ténis em cadeira de rodas (este capítulo escrito por Joaquim Nunes – responsável nacional da Federação Portuguesa por este departamento).
Afortunadamente, el autor de este libro es alguien que cumple varios roles: investigador, entrenador y formador. Por ello, tanto los contenidos como el estilo responden a un interés genuino en facilitar la adecuada transmisión de la información de manera que se intenta atraer el interés del lector...”

Miguel Crespo – International Tennis Federation


“Com esta contribuição, mais um passo é dado no sentido do aumento do conhecimento dos técnicos nacionais e, consequentemente, da excelência do treino da modalidade em Portugal, e em todos os países de expressão linguística portuguesa, em especial atráves da co-operação entre a Federação Portuguesa de Ténis e a Confederação Brasileira de Ténis neste projecto”

Victor Cabral – Federação Portuguesa de Ténis


“Parabenizo ao Professor César Coutinho pela brilhante iniciativa e dedicação na elaboração deste livro... o Prof. César o redigiu de uma maneira objectiva e prática, estando pronto para ser aplicado em nossos treinamentos”

Cesar Kist – Confederação Brasileira de Ténis


“um manual de grande utilidade para os profissionais que intervêm ao nível do processo de treino e formação de tenistas, mas também um documento de consulta muito interessante para todos os apaixonados pela modalidade que pretendam compreendê-la um pouco melhor”

Pedro Pezarat-Correia – Faculdade de Motricidade Humana

A Primeira edição conta com um número de exemplares limitados.

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O Autor e Editor
César Coutinho
http://www.cesarcoutinho.com/
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quarta-feira, dezembro 05, 2007

A Resistência Intermitente


Durante o último Simpósio Mundial de Treinadores, realizado no final de Outubro de 2007 no Paraguai, houve uma apresentação que gerou bastante controvérsia, e que trouxe algo de novo para a modalidade. Essa apresentação esteve a cargo de Horacio Alselmi, um especialista Argentino em Treino e Preparação física, que trabalhou com nomes como Gaston Gaudio, Juan Martin del Potro, Nicolas Massu, Guilhermo Coria e David Nalbandian. Treinou vários medalhados Olímpicos em outros desportos, e é responsável pela preparação física de todos os escalões no clube de futubol Boca Juniores em Buenos Aires. Foi também director Nacional dos desportos de alto rendimento na Argentina. Com dupla licenciatura (quimica e Ciências do desporto) e doutorado em desporto, é actualmente professor na Universidade de Buenos Aires e do Instituto Argentino do desporto.

Existem dois tipos de desportos relativamente à classificação da resistência – os desportos cíclicos e os desportos acíclicos. Nos desportos cíclicos incluímos desportos que mantêm uma cadência mais ou menos semelhante ao longo de todo o período de esforço e que geralmente recorrem fundamentalmente a um tipo de fonte energética. Depois existem os chamados de desportos acíclicos, que são desportos em que há variações de intensidade ao longo da actividade.
Como sabemos, há 3 tipos de fontes energéticas, o sistema aéróbio, presente geralmente em esforços de baixa intensidade e duração relativamente longa, o sistema anaeróbio láctico, que provoca acumulação de ácido láctico no organismo, e que aparece quando um esforço intenso (que ultrapasse o limiar anaeróbio) se prolonga no tempo, e o sistema anaérobio aláctico, que é responsável por esforços intensos de curta duração (geralmente inferior a 10 segundos). Esta análise geralmente é feita de uma forma separada, bem como o seu treino.
Nos desportos acíclicos, que é o caso do ténis, sabíamos que o sistema aláctico representava um papel bastante importante, provavelmente o mais importante, tal como já tinha sido descrito por Schonborn, quando afirma que o ténis é 70% anaeróbio aláctico. No entanto, devido ao facto de ser um desporto de longa duração, ou seja, em que há vários esforços intensos, mas durante um longo período de tempo (por vezes 4 a 5 horas em torneios do grand slam), sempre se pensou que fosse necessário realizar um bom trabalho de base, mesmo com atletas de alto rendimento, de modo a melhorar a resistência de base antes de introduzir exercícios que estimulem os sistema aláctico, como fonte energética principal. Geralmente introduzia-se um trabalho de base aeróbia num período preparatório geral, incrementando-se um programa gradualmente mais intensivo á medida que nos íamos aproximando do período principal de competições. Estes sistemas partem de uma análise diferenciada dos diversos sistema energéticos, e sua consequente aplicação nos métodos de treino. É relativamente comum ver jogadores de todos os níveis e idades realizarem exercícios de corrida contínua, de 20 minutos, 30 minutos, e por vezes até de uma hora, sem qualquer tipo de aceleração. Desde o miúdo de 12 ou13 anos que começa a levar o ténis com maior seriedade, até ao atleta de alto rendimento num top 50 ATP (vi alguns a realizar o mesmo durante o Open da Austrália este ano). Sendo o ténis um desporto acíclico, o conceito de resistência intermitente entra aqui em acção. Quando questionado sobre os métodos usados para desenvolver a resistência dos seus atletas de modo a poderem aguentar jogos de alta intensidade durante 3, 4, 5, ou mesmo 6 horas de jogo, o autor referiu que NUNCA usa métodos contínuos...nem fora e nem dentro do court. Nesse momento, a plateia ficou toda calada e estupefacta, e toda a gente levantou o braço com perguntas para fazer, tendo-se gerado uma das conversas mais interessantes do simpósio (que atrasou em meia-hora a comunicação que se seguia), sendo que quando a ITF tentou interferir para passar à apresentação seguinte, foi claramente expulsa por quase todos os assistentes, que queriam fazer milhares de perguntas. Apenas A Federação espanhola e a Argentina e mais uma ou duas federações já conheciam e aplicavam este conceito, e já tinham iniciado a sua implementação em Espanha e nos seus respectivos países. Curiosamente, Espanha e Argentina são dois dos países mais avançados do mundo na nossa modalidade.
Segundo o Horacio, os esforços de duração inferior a 10 segundos, e que não causem desgaste total com fadiga elevada, se forem inseridos durante pelo menos 20 minutos numa relação entre esforço e recuperação que não seja superior a 1:2 (ex: 5 segundos de esforço para 10 segundos de pausa), fazem trabalhar o sistema aeróbio, mais especificamente o VO2 máx, usando a Creatina Fosfato (responsável pelo processo aláctico – ATP-CP) e desenvolvendo as fibras rápidas, que são aquelas que queremos desenvolver de modo a não diminuir a velocidade do atleta quando trabalhamos resistência (problema do método contínuo). Se utilizarmos o método contínuo uniforme (corridas prolongadas), o que se passa é que estamos a desenvolver as adaptações centrais ao esforço, ou seja, adaptações ao nível do coração, no entanto, as adaptações periféricas (musculares) não se irão desenvolver da forma como queremos. Todos nós já sentimos que depois de um periodo de treino prolongado sem competição, sentimos-nos lentos, e geralmente dizemos que precisamos ainda de alguns jogos em cima para entrar no ritmo. Naturalmente que há outros factores, mas o trabalho realizado durante esse periodo representa um papel fundamental nesta sensação. Não apenas o tipo de esforço realizado durante a parte física correspondente, como também a qualidade da bola de treino, ou seja, a espcificidade do treino. Sabemos que para um VO2máx em condições, é necessário haver adaptações centrais e periféricas, ou seja, o coração tem de ser capaz de bombear de uma forma potente e consistente para as células, mas as células em causa têm de ser capazes de aproveitar e distribuir o sangue que lá chega. Quando trabalhamos com métodos contínuos, o sangue é redireccionado para as chamadas de fibras lentas ou oxidativas, aumentando o número de capilares sanguíneos nessas mesmas células, que não serão depois aproveitados quando o jogador estiver em situação de esforço, visto que o que interessa é o aumento do número desses capilares sanguíneos nas fibras rápidas ou glicolíticas que estarão em constante produção ao longo de um jogo de ténis. Por outro lado, quando realizamos esforços intermitentes (não superiores a 10 segundos com um máximo de 1:2 de pausa e com uma duração mínima de 20 minutos), estamos a trabalhar igualmente as estruturas centrais de adaptação, visto que a partir de uma adaptação inicial ao esforço, em que há uma ligeira subida do lactato sanguíneo, este estabiliza, bem como a Frequência cardiaca (Anselmi, 2007), e a fonte energética principal passa a ser a fonte aeróbia, utilizando constantemente a creatina fosfato em cada período de esforço. Isto acontece devido a processos quimicos que ocorrem desde o início do esforço intermitente, e que estão bem explicados nas referências abaixo explicitadas. O que se passa é que a Creatina Fosfasto (CP) irá servir de fonte energética para o sistema aeróbio, o que à primeira vista parece uma contradição energética. Daí o autor aconselhar a suplementação em Creatina para aumento da resistência do jogador de alto rendimento!!! Sabíamos que a Creatina poderia fazer aumentar a força em cerca de 5 a 10 por cento (tanto na força máxima como na força explosiva), o que não se demonstrava significativo para a nossa modalidade, a não ser em níveis muito elevados, e para determinados tipos de jogo. No entanto, o facto desta suplementação fazer aumentar os níveis de resistência, faz a situação mudar de figura.
No meu trabalho na parte física do Gastão, este conceito já estava a ser inserido, sem no entanto conhecer uma resposta fisiológica total naquilo que preconizava. O introdução de métodos contínuos no trabalho de resistência era feita muito pontualmente, sendo quase que apenas usada para recuperação, ou antes do início de um bloco de treino. Tal como eu, outros treinadores e preparadores físicos aplicavam coisas semelhantes, sem que um estudo real houvesse soubre estes aspectos. Quando o Gastão esteve em Março deste ano com o Federer, fizeramexercicios que se assemelhava em muito ao exercícios que eu e o Luís realizáva-mos com ele. O preparador físico do Federer, que se encontrava presente, falou em exercícios intermitentes, visto que a Suiça foi uma das primeiras a ter acesso a esta informação (juntamente com a espanha no início deste ano), tendo-a implementado quase de imediato. Na altura, eu chamava a tudo trabalho intervalado, pelo que achei que era uma forma de eles denominarem de forma diferente um trabalho intervalado mais específico (era assim que aparecia no nosso programa). Curiosamente, nos testes que realizáva-mos na Faculdade ao nível do VO2 máx, os valores do Gastão eram baixos, o que poderia fazer crer um nível de resistência baixo. No entanto, raramente ele referia que se tinha sentido cansado durante um jogo, tendo mesmo realizado um jogo à melhor de 5 sets, com uma duranção de cerca de 4 horas no último embate da Taça Davis, em que me disse que estava bastante bem no 5º set, como se se tratasse de um 1º, e que não tinha sido por isso que tinha perdido (6/3 no 5º com Robin Haase). Na última avaliação que realizámos no final de Setembro, os valores de VO2máx contnuavam baixos, havendo no entanto um valor curioso – a adaptação inicial era bastante rápida, e indiciava um valor elevado, que com o prolongar contínuo do esforço não se verificava. Nesta apresentação, o Horacio falou precisamente disso, dizendo que o teste normal para avaliação do VO2 máx, não leva em atenção as adaptações periféricas nas fibras rápidas, estando desenhado para desportos cíclicos com avaliação da capilarização das fibras lentas. O que se estava a passar com a avaliação do gastão era precisamente essa, ou seja, a adaptação inicial era elevada porque era aquela que solicitava as fibras rápidas e a sua adaptação, sendo que com a estabilização naquele nível de esforço, as fibras lentas entravam em acção e havia automaticamente uma diminuição dos valores. Na altura pensei em algo deste género, no entanto não conseguia explicar com esta confiança e segurança nos parâmetros todos fisiológicos. O autor propõe diversos testes para avaliação de resistência intermitente, e todos eles têm obrigatoriamente de incluir períodos de pausa e esforços de elevada intensidade e curta duração de modo a não provocar acumulação de lactato.

A comprovação e explicação deste método e forma de pensar vem revolucionar o conceito da Bioenergética desportiva e os métodos de trabalho de determinados aspectos da preparação física que são determinantes...simplesmente excelente.



César Coutinho
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